quinta-feira, 24 de janeiro de 2013



O Pássaro de Fogo e outros contos populares da Rússia
(Neide Medeiros Santos – Crítica literária FNLIJ/PB) 


            O conto mente, mas nele está presente uma lição a toda boa gente. 

(A.  S. Púchkin)

            Era uma vez... Havia um reino... Certa vez... assim começam muitos contos populares e infantis. Estas expressões remetem a um passado longínquo, a um tempo indeterminado. Os estudiosos da literatura afirmam que os contos que falam em fadas e reinos encantados estão intrinsecamente ligados aos contos populares.
            “O Pássaro de fogo: contos populares da Rússia” (Ed. Berlendis Vertecchia, 2011), com tradução do russo por Denise Regina de Sales, ilustrado por Nikolai Troshinsky e comentário de Flávia Moino, apresenta seis histórias de Alexander Afanássiev.
            Afanássiev, por seu trabalho de pesquisa e recolha de contos populares da Rússia, é comparado aos irmãos Grimm. O grande mérito das histórias de Afanássiev é a preocupação em preservar a autenticidade popular dos contos russos.
            Denise Regina de Sales, a organizadora deste livro, foi repórter, locutora e tradutora na rádio Vox da Rússia, em Moscou, defendeu tese de doutorado na USP em Literatura e Cultura Russa e trouxe para o leitor brasileiro seis contos maravilhosos de Afanássiev traduzidos diretamente do russo.
            As bonitas e expressivas ilustrações do livro são do desenhista Nikolai Troshinsky que nasceu na Rússia, mudou-se ainda criança para Espanha e já ganhou vários prêmios internacionais na área de ilustração.
            Quanto à Flavia Moino, sua dissertação de mestrado em Literatura Russa (USP) versou sobre Afanássiev e o conto popular russo. Por essas breves informações, sentimos que estamos diante de uma obra de reconhecido valor literário e que exigiu a presença de especialistas da área..
            O primeiro conto “O pássaro de fogo e Vassilissa-Filha-de-Rei” fala sobre um reino muito distante, muito além da vigésima sétima terra, habitado por um rei forte e poderoso. O rei tinha um arqueiro que era dono de um cavalo mágico e com esse cavalo saía pelo bosque para caçar. Certo dia, o arqueiro deparou-se com uma pena dourada do pássaro de fogo, embora advertido pelo cavalo que não deveria pegar naquela pena, o arqueiro desobedeceu à ordem do cavalo e resolveu levá-la de presente ao rei.
            O rei agradeceu o régio presente, mas exigiu que ele trouxesse o pássaro inteiro com estas palavras: “Se não o trouxer daqui minha espada, daí sua cabeça cortada”. (2012: 6)
            O pedido foi satisfeito e o rei exigiu mais – agora ele queria uma noiva.  Para conseguir realizar o novo pedido do rei, o arqueiro encontrou inúmeros obstáculos, mas contou com a ajuda da princesa Vassilissa e depois de muitos enfrentamentos viu a morte de perto, venceu os perigos e saiu vencedor.
            O compositor russo Igor Stravinsky compôs a música para um balé muito famoso chamado “O pássaro de fogo” (1910). O enredo desse balé se baseia nesse conto e em outro conto de Afanássiev – “Rei dos mares e Vassilissa, a Sábia” que também se encontra neste livro.
            O último conto – “Vá lá-não-sei-onde, traga não-sei-lá-o-quê” é o mais longo de todos e apresenta afinidades com outros contos populares ocidentais. É rico em detalhes e diálogos.
            Novamente vamos encontrar um arqueiro que trabalha pra um rei e é considerado o melhor caçador do reino. Todos os dias ele partia para caçar e sempre abastecia a mesa do monarca com aves. Um dia ele feriu a asa de uma rolinha e estava pronto para matá-la quando ouviu este pedido:
            “- Ah fabuloso arqueiro! Não tire a minha vida, não me mande embora deste mundo de Deus: o melhor é me deixar viva, leve-me para sua casa, ponha-me na janelinha e fique observando: assim que perceber que vou cair no sono, no mesmo instante, bata a mão direita em mim com toda força, e terá muita sorte”. (2012: p. 45).
            O arqueiro ficou admirado, já havia caçado e matado muitas aves e nunca encontrara uma que falasse. Satisfez o desejo da rolinha e mais admirado ficou quando ela se transformou em uma moça de beleza indescritível. Tempos depois, resolveu casar-se com a moça de bondade e beleza sem igual e passou a sofrer perseguições, inclusive pelo rei. Todos desejavam possuir aquela mulher  bonita.    
            Neste conto, há as transformações de objetos visíveis em invisíveis e vice-versa, características marcantes das culturas eslavas. 
            Os contos de Afanássiev são cheios de aventuras, cenas mágicas e de muita emoção. Quando são narrados de forma oral prendem a atenção do leitor pelo clima de suspense e surgimento do inesperado. 

( Publicado no jornal Contraponto. Coluna: Livros&Literatura. Paraíba, 18 a 24 de janeiro de 2013) 

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